No
final de 1970 o Brasil sofre uma pequena transformação musical quando o rock
começa a se sobressair e ganhar mais destaque no meio artístico musical. É
neste contexto que surge em Curitiba, a Banda Blindagem, a legítima
representante paranaense da grande onda que se espalhava pelo planeta. Nessa
entrevista Paulo Juk fala de como foi o começo da carreira da banda, parceria
com Paulo Leminski, histórias das músicas do Blindagem e do que acha de cenário
atual da música no Brasil.
Como
foi o começo de carreira e qual era a ideia no começo da banda?
"Bom
na verdade eu que dei o nome de blindagem. Não surgiu de uma ideia minha, pois
na verdade qualquer garoto que gostasse de Beatles e Rolling Stones queria
montar uma banda e eu não era diferente, tinha uma banda e gostava muito de
música, morava no interior, adorava música sertaneja e caipira, a partir daí
conheci o rock e nunca mais larguei."
Tem
muitas influencias da música caipira no Blindagem. Isso veio como algo natural
de suas influências?
"É
uma coisa natural. Sempre tivemos o habito de compor tudo no violão, e o violão
naturalmente caminha para uma coisa mais suave. Essa coisa de parecer mais
regional esteve presente desde o primeiro disco do Blindagem. Antes a gente
tocava, mas não esse estilo de música, era algo até mais puxado para o Hard
Rock.”
“Quando
fomos gravar o primeiro disco, conhecemos um produtor, e tocando violão na casa
dele as conversas se direcionaram para o trabalho do primeiro disco. Coisa que
o Ivo fazia com Paulo Leminski na época. Depois de pronto vimos que o disco
tinha toda essa conotação dirigida para uma coisa não exatamente regional, mas
meio que com uma defesa da ecologia falando de natureza. E como o disco foi
muito emblemático na época e até hoje continua sendo vendido e procurado, no
decorrer da nossa carreira, sempre fizemos músicas com essa mesma conotação,
seguindo essa linha; falando do Paraná e do “Cheiro do Mato””.
“Quando
fizemos “La Vai o Trem” morávamos no Rio de Janeiro. “Igual A Mim” retrata a
situação que vivíamos la de ver assalto dentro do ônibus. Pegávamos ônibus para
ir para a gravadora e do nada subia policiais armados dentro do ônibus para
fazer revistas. Esta foi uma inspiração do Ivo e que mostrava que ninguém podia
prender nem eu nem você, somos pessoas livres. Como qualquer música, o rock
representa o cotidiano. Seja naquela época ou na época atual o rock sempre teve
essa conotação desde a guerra do Vietnã. A letra representa algo do cotidiano
que a gente vê no dia a dia.”
O
que você acha da moda do vinil?
"O
que eu penso é que não é a moda do vinil, qualquer moda é cíclica. Assim é com
a música, hoje vemos bandas fazendo música parecendo Pink Floyd dos anos 70. E
fazendo como se fosse moderna e pode até ser moderno, já que tudo é cíclico.
Voltar no vinil é quase algo natural, pela nostalgia. Hoje a tecnologia é tão
apurada que sempre vai ter a nostalgia e a curiosidade de ver e rever como era.
As picapes que estão sendo vendidas hoje já estão saindo com a agulha digital
que tira o timbre gostoso de ouvir que é totalmente diferente e impossível de
ouvir no CD, no DVD ou Digital"
Semana
Passada completou 50 anos do lançamento do Sgt. Pepper's Lonely Hearts Club Band dos Beatles. Você
é um grande fã de Beatles e de música em geral, Tem algum disco que marcou sua
vida?
"Sou
suspeito para falar porque sou um Beatlemaniaco. Eu gosto de tudo dos Beatles.
É difícil, pois minha vida mudou quando eu ouvi uma música dos Beatles do álbum
"Please Please Me", em 1962/63. Para mim a música se divide como
antes e depois dos Beatles. Não adianta hoje um cara dizer que não gosta de
Beatles mas gosta de outra banda. Todas as outras bandas surgiram de alguma
forma com alguma influência dos Beatles ou foram influenciados por alguém que
foi influenciado por eles. Com Beatles você tem heavy metal, hard rock, baião,
você tem de tudo. São os gênios da nossa geração."
Qual
sua relação e opinião hoje com o rádio, LPs, músicas para download e streaming?
"Não
tem como fugir disto, é uma coisa natural da tecnologia. Se na década de 60/70
vivemos uma revolução cultural, de liberdade sexual, e tudo, hoje em dia é uma
revolução tecnológica que muda de dia a dia. Por mais nostálgico que seja ficar
ouvindo LPs é algo natural da tecnologia, reformando conceitos. Nem download de
músicas estão fazendo mais hoje em dia, poucas pessoas fazem, a maioria está
indo para o streaming mesmo. Acho inclusive que a rádio vai sobreviver com
notícias, pois é difícil com o Spotify você querer ligar a rádio."
Nos
últimos anos tivemos uma grande ascensão Funk e do Sertanejo Universitário.
Como você vê o cenário musical hoje em dia?
"Como
eu falo sempre, tudo é cíclico. Na década de 80 só existia rock no Brasil e
todas as bandas de rock tocavam no rádio. Uma vez fiz um show com o Blindagem
no Rio de Janeiro, tinham 42 bandas naquele evento e todos tocaram no radio sem
parar.
“Os
Paralamas do Sucesso, RPM, Kid Abelha, Engenheiros do Hawaii e outras bandas
tocavam no radio direto, esta era nossa realidade, o que aconteceu foi que
naturalmente há um esgotamento. Como as bandas talvez não fossem tão unidas a
ponto de criaram um movimento de conservação que fizesse um ajustamento de
formas musicais, mas fosse se preservando, abriu brechas para outros estilos
musicais. ”
“O
sertanejo que a gente fala hoje surgiu há mais de 20 anos a traz. O Blindagem
foi sertanejo, no nosso primeiro LP gravamos uma música do Milionário e José
Rico. O que aconteceu foi que o sertanejo se popularizou e quando vimos se teve
um sertanejo totalmente diferente do que tínhamos antes. Mas o sertanejo de
hoje se organizou e criou estruturas para que outros sertanejos viessem até
chegar no universitário. O próprio sertanejo hoje é rock, os músicos fazem solo
de bateria, guitarra etc. O Funk sempre existiu e são correntes musicais, na
verdade tem espaço para todo mundo."
O
que você acha das bandas curitibanas?
"Curitiba
tem muitas bandas boas, mas nenhuma se sobressaiu a ponto de dizer que é uma
banda de nível nacional. Existem bandas que tem um trabalho de nível nacional e
um reconhecimento nacional como o Blindagem. Hoje tem uma leva nova também que
se destaca. Sempre tivemos excelentes bandas, o problema é nosso mercado aqui
que é meio complicado e como ficamos sempre na dependência de Rio de Janeiro e
São Paulo, complica, pois lá tem centenas de bandas."
Você
acha que Curitiba poderia ter um reconhecimento maior e ter entrado mais no
radar de grandes bandas de nível mundial se a Pedreira Paulo Leminski não
tivesse sido fechada?
“Com
certeza. Tivemos o azar de ter esse espaço maravilhoso fechado durante tanto
tempo e com isso saímos para fora do circuito. Veja quantos shows importantes
já tivemos aqui, Paul McCartney, Ramones, ACDC, David Bowie, não importa o
estilo, tem grandes shows acontecendo e isso é muito importante para a música e
para a cidade”
Como
foi a história do início do Blindagem?
"Foi
algo curioso, pois o Blindagem não tem muitas gravações, nunca se preocupamos
muito com isso. Tivemos algumas músicas que tocaram muito em rádio, mas foram
cerca de 6 ou 7 músicas das quase 50 que a gente gravou e sempre quando tocamos
tem muita gente que canta junto. Antigamente tocávamos muito, desde o
surgimento fazíamos shows sem parar e sempre com músicas autorais. As pessoas
começaram a gostar nos ouvindo cantar. De tanto tocar acabou virando
sucesso."
Uma
dica para quem quer começar?
"Por
mais difícil que seja, insista no seu trabalho. Se hoje toco em um bar é porque
eu quero tocar. Eu não precisaria, mas acho divertido, até faço cover. Sei que
é difícil, mas se você tem um trabalho autoral, foque nele, se você faz cover,
foque nisso. Não saia da sua identidade."
Vocês
tocam com orquestra, como vocês juntam estes dois estilos musicais?
"A
primeira banda do Brasil a fazer um show com orquestra foi a nossa. Eu
particularmente sempre quis tocar com orquestra. Vi Beatles fazer show com
orquestra, vi Scorpions e Deep Purple fazer show orquestra depois outras bandas.
”
“Acho
a coisa mais linda do mundo esta interatividade do rock com a orquestra, até
porque considero vários compositores e mestres da música clássica
roqueiros."
“É
maravilhoso você misturar Villa-Lobos com La Vai o Trem. É muito bom, é música,
você pode até não gostar, mas não pode desmerecer o trabalho de qualquer um que
faz qualquer coisa. ”
E as
letras com Paulo Leminski? Sempre tiveram muitas parcerias do Blindagem, fale
um pouco.
"Na
época era algo de sinergia, núcleos culturais. Tinha o Leminski que era um
letreirista, o Ivo que era músico, eu era mais jovem mas convivia. Tinha um
movimento artístico chamado "MAPA" (Movimento Artístico Paranaense
Autoral). O Leminski sempre gostou de escrever, e a amizade dele com o Ivo se complementaram
nesta parte artística. ”
“O
Leminski escrevia tudo de uma forma haikai mas Ivo escrevia com 3 notas
musicais algo bonito. Em mesa de bar vi surgir coisas lindas. Tinha um projeto
chamado Em prol de um português elétrico e o Leminski estava junto. As letras
desde lá atrás eram do Paulo Leminski, ele é um cara muito criativo, um cara
fácil de lidar. Uma vez eu fui na casa do Leminski e Gilberto Gil estava lá. Ele
foi o primeiro a ouvir a fita do blindagem."
Blindagem faz parte da minha historia, é sempre bom conhecer um pouco mais sobre esses monstros do rock. Tenho orgulho de ter crescido ouvindo eles contando a historia do nosso Paraná. Parabéns senhores ótima reportagem!
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ResponderExcluirObrigado, Julio!
ResponderExcluirRealmente o Blindagem é uma parcela importante da história do nosso estado e precisamos valorizar ainda mais isso. Agradecemos pelo feedback.