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segunda-feira, 26 de junho de 2017

O dinossauro do jornalismo esportivo

Em entrevista o multitalentoso Antonio Carlos Carneiro Neto, fala sobre sua carreira, suas desilusões, trabalhos e a conquista de uma cadeira na Academia Paranaense de Letras
 

Aos 69 anos, Carneiro Neto, o simpático cronista esportivo da Gazeta do Povo que escreve no jornal há 33 dos seus longos 53 anos de carreira, nos encontra para uma agradável conversa sobre sua vida e trajetória. O atleticano nato que diz estar acima do clubismo, fala sobre sua contribuição em vários meios de comunicação, seus livros, a extensa lista de ocupações e sua vontade de continuar escrevendo. Formado em Direito, mas um incurável amante do Jornalismo, ele conta sua relação com o futebol paranaense, suas decepções e esperanças. Carneiro relembra com tom nostálgico o começo da carreira e os tempos de ouro do futebol. O profissional incansável, usa um tom apaixonado para falar sobre a carreira que escolheu e com orgulho, comenta sobre seu lugar na Academia Paranaense de Letras.
O que levou o senhor a escolher essa carreira? 
Foi na verdade uma coincidência, eu era estudante, estava no ginásio e morava em Ponta Grossa, tinha 16 anos de idade e adorava ouvir rádio, futebol, transmissão de jogos e na época o Brasil era bi campeão do mundo, isso foi no ano de 1964. Portanto eu tenho 53 anos de profissão ininterruptas, e um amigo que jogava futebol em um clube de Ponta Grossa chamado Guarani, escrevia no jornal e disse “já que você fala tanto de futebol por quê não vai comigo na emissora?” eu narrava até jogo de botão, ele acabou me levando na emissora, por uma coincidência histórica cheguei lá em março de 1964 na época da ditadura militar, eu fiz um teste e imediatamente me contrataram, porque eu já tinha uma voz adequada e lia muito jornal, meu pai tinha uma máquina de escrever em casa eu batia bem a máquina, era muito informado, modestamente muito esperto, fiquei na rádio e já fui pro jornal da manhã. No ano seguinte, meu pai foi removido para Curitiba devido ao trabalho, entrei para rádio Guaracá, no jornal do Estado do Paraná, Tribuna do Paraná, TV Iguaçu, e estou até hoje trabalhando com esporte, claro que percorri todos os caminhos, fui repórter, narrador, chefe de equipe, tive minha própria equipe, diretor de emissoras de rádio, editor de jornal, editor de televisão, produtor, apresentador, tudo o que você possa imaginar na parte esportiva, de rádio, jornal, televisão, e hoje mantenho apenas meus comentários na rádio CBN e a coluna na Gazeta do Povo. Eu sempre tive vocação e vontade, e as coisas deram certo.  Claro que antigamente não tinha faculdade de Jornalismo, então quem conseguia uma oportunidade e sabia operar, tinha uma vantagem enorme, e saber escrever era quase um dom. 

Como é seu processo criativo?
 É um tema que eu domino, eu penso em escrever a coluna a partir do momento que eu acordo, escrevo pela manhã, estou pois estou com a cabeça liberada, já na radio é instantâneo, evidente que tem um gancho um tema em que se trabalha para falar. Procuro não falar do lugar comum, não falo só sobre fatos esportivos, puxo outros temas que se relacionem e que a conclusão é o esporte. Eu crio uma linha em que leva o leitor a viajar para outras áreas, que tenham alguma coisa com o objetivo final do comentário, isso foi positivo, me diferenciado dos outros colunistas. Criei uma cultura geral.

Como foi o inicio da carreira? turbulento? Tranquilo? 
Pela facilidade do começo é que ajudou a minha carreira, normalmente o inicio é difícil, em qualquer profissão, você tem que aprender os ofícios mas isso parecia já estar em mim. Depois de 5 anos de repórter fui convidado para ser narrador, e no segundo ano fui eleito o melhor narrador, ganhei os primeiros troféus e no quarto ano virei chefe da equipe, as coisas aconteceram muito rápido, eu comecei com 16 anos e com 23 já era chefe de equipe. Eu chegava na emissora com 7 patrocinadores, cheguei a narrar jogos com gripe, eu era completamente apaixonado pelo que fazia. O meu sucesso se deve a vocação ao trabalho e muito esforço.

Como o senhor lida com essa questão de ter muitas ocupações?  
Antigamente Curitiba era menor, vamos dizer assim eu “dava conta” primeiro porque o jornal e a Televisão que eu trabalhava eram no mesmo prédio, e tudo ficava no centro, eu trabalhava na rádio Clube Paranaense umas três quadras dos outros dois, eu matava rapidamente 3 empregos por serem perto. Isso fora a agência de publicidade e o cargo público. Era uma vida intensa, ativa e pra relaxar eu tinha a faculdade a noite. Era fácil a movimentação, que era tudo no centro, em cinco minutos você estaria em todos os lugares, e também quando não deu mais eu diminui o ritmo, fechei a agência, fui parando, mudou a minha vida devido o crescimento da cidade, mas como eu já tinha um nome na marca esportiva eu continuei trabalhando nos 3 veículos, sempre dando preferência pro rádio, em relação a televisão, eu nunca fiquei muito empolgado com ela, sempre me considerei um homem de rádio e o jornal era um complemento. Na minha vida foram 70% rádio, 20% jornal e 10% televisão.

Como foi para o senhor essa conquista da Academia de Letras Paranaense?  
Foi o meu Oscar. Nunca imaginei que teria essa gentileza dos acadêmicos de identificarem em mim uma pessoa capaz de merecer essa honraria, sempre fui uma pessoa simples, e apesar de ter ganho muitos prêmios e ter sido reconhecido pelos companheiros, a Academia foi uma coisa absolutamente surpreendente. Eu reputo minha eleição na Academia pelas minhas cronicas na Gazeta do Povo, onde escrevo há 33 anos. Os acadêmicos identificaram um texto diferenciado, uma profundidade nas análises, então dois ou três dos acadêmicos que eu conhecia, ex-colegas meus, que são jornalistas, me procuraram, perguntando se eu consideraria o convite, e eu, de forma simpática, me coloquei de maneira positiva, dizendo que seria uma honra. Então fizeram uma eleição, na qual concorri com um médico, e eu fiquei muito feliz. Hoje me sinto recompensado pelo trabalho que realizo com essa homenagem. Mas não me considero imortal, quando vou atravessar a rua, olho para os dois lados.

Como o senhor se sente em relação ao futebol paranaense atual? 
É simples, o futebol mudou, o mundo mudou, a vida mudou, e quem não se atualiza fica muito irritado com as coisas que acontecem. Os jogadores antigamente eram semi-profissionais, eram amadores, jogavam buscando um emprego, eles tinham amor à camisa, ficavam no mesmo clube, como o Zico que jogou a vida inteira no Flamengo, ou o Pelé no Santos. Isso não existe mais, aí o torcedor vê o jogador no Atlético, logo mais ele está no Coritiba, daqui a pouco está no Paraná. Esse mercantilismo, essa profissionalização, diminuiu a paixão do torcedor pelo ídolo. O jogador é o ídolo do dia, do momento, mas não é o ídolo eterno, como o Coritiba, por exemplo, que reverencia o Kruger até hoje, ou o Atlético com o Sicupira, o Paraná Clube com o Saulo, pois foram ídolos que jogaram só naquele time. Isso é muito complicado, não existe mais. E os jogadores ganham muito dinheiro, o futebol, na minha visão, perdeu em qualidade, porque ele deixou de ser uma competição essencialmente esportiva, o futebol virou espetáculo, virou show, como da Madonna ou Michael Jackson. É claro que o futebol perdeu todo o charme no meu modo de entender, eu viajava para ver clássicos, até mesmo a Seleção Brasileira perdeu o charme e também o rumo, depois daquele 7x1. Por exemplo, quando o Brasil perdeu a Copa do Mundo para o Uruguai em 1950 no Maracanã, houve uma comoção nacional, os brasileiros se mostraram muito tristes com aquela derrota, ficaram falando durante muito tempo sobre o "desastre de 50", agora uma pergunta, o Brasil perdeu por 7x1 para a Alemanha, houve comoção? Não. Todo mundo xingou os jogadores, no dia seguinte a vida continua, e hoje ninguém mais fala, em 50 era outra sensação. Mudou o enfoque, as coisas mudam muito rápido, as notícias são muito rápidas, a internet, com as redes sociais banalizaram tudo. O mundo mudou, ao meu ver, para pior, ficou desumano, e o futebol perdeu a humanidade.

Apesar da sua insatisfação, o senhor continua escrevendo sobre futebol. Por que? 
Por uma razão muito simples. Eu tenho verdadeira paixão pela profissão. Não estou em rádio ou jornal por causa do futebol. Eu estou por causa da minha paixão por ser jornalista. A sensação do jornalista esportivo é ver as coisas mudando e notar que você está ficando um dinossauro, mas você resiste a se afastar da floresta. Minha participação hoje é mínima, não transmito mais jogos há dez anos, vejo os jogos pela televisão. Mas eu mantenho esse vínculo, e manterei até quando me for possível. Quando não for mais, é evidente que vou sair de cena.

Tem esperança de que o futebol tenha de volta os seus tempos de glória? 
O futebol não perdeu a glória, ele ainda é muito emocionante, mas antigamente todos os jogos eram bons, os melhores jogadores ficavam no Brasil. Quando você vê um jogo do Barcelona, por exemplo, nota que é outro futebol. O que aconteceu com o futebol brasileiro foi uma queda técnica, que infelizmente não tem volta. O mercado hoje é globalizado, as conquistas são mundiais, mas a gente tenta captar alguma coisa positiva, mas a média caiu muito. Então não tenho expectativas porque é algo que não volta mais. É como querer namorar na matinê do cinema, não existem mais matinês. O futebol é algo que passou. O mundo muda, por que o futebol não haveria de mudar? 

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Por Carolini Déa e Fernanda Facchini

Atualizado 06/10/17, às 12h56.

2 comentários:

  1. Futebol virou jogo de tabuleiro, agora quem brilha são os técnicos, as peças (jogadores) são apenas bonecos. Não que isso não seja importante, na vdd os "professores" também precisam de "glamour", mas por que não buscar um equilíbrio? Onde todos são essenciais.

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  2. Este é um ponto muito debatido no futebol atual e principalmente no futebol brasileiro, onde o treinador recebe toda a carga pela derrota e está constantemente trabalhando sob o risco da demissão. Mas o futebol é um esporte de união em grupo que engloba não só o trabalho do líder(treinador), mas também os seus jogadores, comissão técnica, equipe médica, roupeiros, etc. Então realmente é necessário encontrar um ponto de equilíbrio em que o trabalho de todos os membros do grupo seja reconhecido, seja nos resultados positivos ou negativos. Obrigado por sua participação, Maycon.

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